Em entrevista à revista Fórum a
professora Analise da Silva celebra a chegada de cotas aos cursos de pós
graduação da UFMG e faz uma crítica muito pertinente ao programa “Escola Sem
Partidos”, que presta um desserviço à educação dos jovens sob esse discurso
criado após essa onda antipetista que se traduziu em uma onda anti todo e
qualquer discurso progressista.
O foco é que, como a professora
lembrou bem, jovens abandonam a escola antes de concluírem o ensino médio por
enfrentarem o racismo, a homofobia, o machismo e todas as demais perseguições
violentas por parte dos colegas, cuja educação na rua ou em casa não lhes
permite conviver com a diversidade, muito pelo contrário, a tendência é
rechaçá-la.
Nisso, me lembrei dos meus tempos
de escola. Muito cedo aprendi a ter vergonha da minha boca, minha boca de
negro. Porque recebia diversos apelidos vindos de outros meninos também negros (em
sua maioria) e pobres (em sua totalidade). Mas essas crianças não se
reconheciam como negras, bastava uma tonalidade levemente mais cara para que se
sentissem autorizadas a tratar o colega como “macaco”, “beiço de mula”, entre
outras classificações. Tudo isso era muito comum e transformava a escola num
ambiente extremamente hostil, principalmente se o aluno não estava cercado por
outros que pudessem ajudá-lo a se defender dos demais ou não tinha força física
para tanto. As meninas negras também tinham sua autoestima constantemente
reduzida por apelidos que fariam referência às suas características étnicas,
desvalorizando-as. Um colega de classe, que aos 10 anos aparentava ser mais
afeminado foi agredido durante o intervalo por outros 10 ou 15 meninos da minha
sala, que passarem pimenta na boca e nos olhos dele. No outro ano uma menina foi cercada no
intervalo por outros vários meninos que a assediaram, ela que também tinha
apenas 10 ou 11 anos. Toda essa violência veio de crianças que reproduziram o
comportamento e a visão intolerante, do poder do mais forte sobre o mais fraco,
da homofobia, do racismo e do machismo. Essas coisas aconteciam e se repetiam
tendo, no máximo, uma repreensão dos professores, mas nada no sentido pedagógico,
nada que realmente mudasse suas perspectivas ou que coibisse atos assim vindos
dos alunos que viriam depois. É só um pequeno exemplo da importância de educar
quanto à diversidade, a identidade de gênero, ensinar a história e a cultura
oriunda da África. Tudo isso somado ao
investimento pífio na educação no Brasil, o que não fazia com que nenhum de nós
visse ali qualquer perspectiva. A evasão da escola, era e é muito comum. Entrei
para a estatística dos jovens com mais de 18 anos que não concluíram o ensino
médio, e tudo começa com uma escola que não acolhe a diversidade, que não
ensina suas crianças a lidar com as diferenças e o impacto pode ser sentido ao
longo da vida, como sub-emprego e repetição das condições de pobreza e
exclusão. Fui um dos poucos que retornou depois e, mesmo fora da faixa etária
tida como ideal, concluí o ensino médio aos 23 e entrei para a faculdade aos 26
anos. Penso o quanto um ensino que contemple um olhar mais diverso, que trate
do respeito às diferenças étnicas, religiosas, de identidade de gênero teria
contribuído para a formação de toda a minha geração e de outras. A tal “Escola
Sem Partido” fomenta uma escola da intolerância e da violência física e
simbólica, além ao embotamento mental ao qual os alunos são submetidos.