Por Rogério Dias
Watchmen é o nome de uma graphic novel considerada um verdadeiro marco dos quadrinhos modernos. Foi concebida nos anos oitenta pelo inglês Alan Moore e ilustrada por Dave Gibbons. A premissa básica da história é "o que aconteceria se vigilantes mascarados, os chamados super-heróis, existissem realmente?". Estamos falando de um mundo imaginário em que as pessoas realmente saíram às ruas para combater o crime, usando fantasias e espancando criminosos.
É a partir dessa pergunta que Alan Moore desenvolve um roteiro simplesmente impressionante e que influenciaria toda uma geração de artistas de quadrinhos que viriam a seguir.É comum encontrar na internet artigos que associam Watchmen à teoria do caos, que aborda a ligação em rede dos fatos. Isso não é por acaso.
Neste universo realístico, e ao mesmo tempo fantástico, o mundo presencia o surgimento de um super-ser que recebe do próprio governo americano o nome de "Dr Manhattan". Os jornais impressos e noticiários de tv exclamam em alto e bom tom "Superman existe, e é americano". Óbvio que o impacto de um acontecimento assim seria o equivalente à invenção da bomba atômica, reforçando a posição de superpotência dos Estados Unidos.
Há um todo um efeito dominó por conta disso.
Como resultado os Estados Unidos venceram a guerra do Vietnam sem grandes problemas, Nixon se manteve no poder até meados dos anos 1980 e o famigerado caso Watergate jamais veio à tona. Kennedy foi assassinado, por um vigilante mascarado conhecido como "Comediante", o único, além do Dr Manhattam, com permissão para agir.
Nesta realidade o governo americano proibiu todas as atividades de aventureiros mascarados durante os anos 70 (toda a história é ambientada em 1985, com alguns flash’s de outras épocas), o que fez com que toda uma geração de heróis se aposentasse.
A guerra fria entre norte americanos e soviéticos se mantêm tensa, mas o fato de os Estados Unidos "possuírem" o Doutor Manhattan (um homem capaz de alterar estruturas atômicas)lhes dá uma enorme vantagem sobre a URSS.
Importante lembrar que a história foi escrita num período em que a ameaça de um holocausto nuclear, causado pelo embate entre as duas grandes potências, permeava o imaginário vigente.
O roteiro de alan Moore, como não poderia deixar ser, é extremamente complexo e adulto, tendo como um dos pontos fortes o plano de fundo, que explora todo um contexto político e cultural no qual a história se mantém ancorada. A ameaça da guerra é muito mais importante que a trama envolvendo os "super-heróis, e eles estão tão impotantes quanto nós, meros mortais.
Há toda uma galeria de tipos fantasiados, cada qual com características que os aproximam de alguns personagens clássicos das HQS.
Rorschach, por exemplo, é o nome de um vigilante que seria uma versão aproximada do Batman com o Questão (este último menos famoso, personagem da extinta editora Charlton Comics que acabou incorporada pela DC Comics, do grupo Warner). Este vigilante é um sociopata que combate o crime utilizando métodos nada ortodoxos, e um dos únicos a agir livremente mesmo sem a aprovação da lei.
Neste contexto os heróis não são exatamente arquétipos de perfeição e moralidade. Os protagonistas são muitas vezes racistas, fascistas, e alguns tem opções sexuais que se chocam com os valores conservadores da sociedade oitentista, fugindo totalmente do modelo clássico do herói moral e fisicamente "perfeito". Além diiso, suas ações são motivadas por razões como auto-promoção e notoriedade. Nada de motivações nobres como "livrar o mundo da maldade e tirania", o discurso aqui é muito mais honesto. Na história as pessoas têm mais razões para temê-los do que para nutrir algum tipo de admiração por eles.
A luta do "bem contra o mal" não é algo tão simples quanto deveria, e nem se trata de um universo assim tão maniqueísta, o que torna a obra tão fascinante.
A narrativa é cinematográfica, tanto os textos de Moore quanto as ilustrações de Gibbons dão o clima perfeito ao enredo. A exemplo da abertura clássica da história, em que presenciamos o assassinato de um dos personagens em flashback. A cena vertiginosa é digna de qualquer grande obra de Alfred Hitchcock, com todo aquele suspense e clima detevivescos.
Uma boa razão para voltar a falar dessa maxi-série é o fato de os personagens finalmente ganharem representações de carne e osso no cinema. O filme está sendo produzido pela Warner e dirigido por Zack Snyder (300).
Embora Alan Moore costume criticar as adaptações de suas obras para o cinema o filme em questão parece estar indo pelo caminho certo, tanto que o próprio Dave Gibbons (desenhista) deu sua benção ao projeto após ter visto de perto o que estão fazendo por lá. Acredito que mesmo Moore, que tem o hábito de torcer o nariz até para adaptações interessantes como "V de Vingança" (2005), vá gostar do resultado. Em todo caso é aguardar e conferir.
Rogério Dias (ou Roger Deff para os amigos) é colaborador da revista Jararaca Alegre, do site do programa Alto Falante, vocal do Julgamento, leitor assíduo de HQs e estudante de jornalismo.
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