A Anistia Internacional tem se
manifestado de forma muito veemente contra o genocídio de jovens negros no Brasil.
Um relatório recente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública indica que a
polícia brasileira matou em 5 anos mais do que a polícia norte-americana matou
em 30 anos. 11.197 óbitos no Brasil contra 11.090 nas terras do Tio
Sam, num período seis vezes superior e a grande maioria das vítimas são pobres,
pretos e favelados.
O texto publicado na revista
Carta Capital da primeira semana de janeiro, intitulado “A violência tem cor”,
escrito pelo diretor da Anistia Internacional, Atila Roque, chamava a atenção
para o quanto essa violência é sistêmica e, pior ainda, naturalizada. Como se
não bastasse a disparidade econômica, a invisibilidade histórica e social, o
jovem negro no Brasil ainda precisa lidar com o fato já aceito de que tem maiores
possibilidade de morrer assassinado do que indivíduos de outros grupos étnicos.
O mesmo texto chama a atenção ainda para o caso do assassinato do jovem Michael
Brown, na cidade de Ferguson. O garoto desarmado que foi morto a tiros por um
policial branco. Aquilo causou uma comoção em todo o país, revolta que acabou
reverberando em várias partes do mundo. No Brasil esses assassinatos não
significam quase nada. Pertencem à “ordem natural das coisas” como se essa
fosse uma trajetória inevitável destes jovens. Já dizia Edy Rock na música “Negro
Drama” (Racionais MCs) “Me ver pobre, preso ou morto já é cultural”. A letra resume bem a situação. Está tudo aí,
colocado: a violência, a pobreza, as drogas e um massacre que,
inexplicavelmente é visto como algo banal. Nada, simplesmente nada aconteceu. Me
lembrei de um episódio de quando eu estudava na 7ª série numa escola estadual
do bairro onde cresci, Jardim Alvorada, região noroeste de Belo Horizonte. Estudávamos
no turno da noite e um amigo meu mexeu com um policial que estava do lado de
fora. Ele gritou lá de cima “Ô gambé!”. O PM olhou e viu nós dois. Era uma
brincadeira, coisa de criança. Principalmente de uma criança acostumada a ver a
polícia tratar todo mundo com desrespeito. Quem mora nos bairros mais pobres
sabe do que estou falando. Quando saímos fomos prontamente abordados por 3 ou 4
policiais. Um deles foi bem claro quando apontou a arma para o meu rosto e
disse com todas as letras que, se quisesse, me mataria ali mesmo e não
aconteceria nada. Meu corpo só ficaria ali, com “um buraco na cabeça”, como ele
enfatizou bem. A situação talvez não tenha ficado pior porque um deles tratou
de conter os demais colegas, dizendo que éramos só estudantes e trabalhadores.
Fomos liberados. Lógico que me assustei.
Mas não acreditava, naquele tempo, que pudéssemos, de fato, nos tornar vítimas
ali, naquele dia e local. Anos depois, quanto mais leio a respeito, vejo
notícias, dados estatísticos, mais percebo que o policial não estava mentindo. Realmente
ele poderia fazer o que quisesse ali e não aconteceria nada, assim como não
aconteceu nas vários assassinatos que ocorrem no Brasil ano após ano.
Precisamos nos indignar com toda e qualquer violência, aqui, ou em qualquer
parte do mundo, e não é possível que tantas mortes continuem sendo
tratadas como números estatísticos frios.
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