quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

A um passo do fim do mundo... ou do dia seguinte!


Foto: EFE

Chegamos ao tão anunciado “fim do mundo”. Não me dei ao trabalho de pesquisar a fundo, mas toda essa história vem de uma profecia maia, cujo calendário previa um desastre global de proporções cataclísmicas para o dia 21/12/12. Há quem leve isso muito a sério.  Da minha parte, não acho que exista alguém capaz de prever com exatidão o nosso último e fatídico dia neste planeta, por outro lado, nada mais sábio e pragmático que tratar cada dia como se fosse o último, porque, apesar de soar clichê, não existem mesmo as tão desejadas garantias. Nos deparamos com “o fim do mundo” todos os dias, só não nos damos conta.

Em um debate que assisti, discutia-se o quanto algumas pessoas temem o armagedon, enquanto outras, por razões religiosas, anseiam por este momento, com a esperança de que a humanidade resurja purificada ou que restem apenas aqueles escolhidos por suas boas ações ao longo da vida. Discurso comum a quase todas as crenças, com as suas devidas adaptações.
Talvez as pessoas prefiram um tal “fim” que cesse com os problemas, dilemas, sofrimentos e, de brinde, ainda traga a esperança de que o pós seja melhor que o agora.

Afinal, o mundo, tal como se apresenta na prática, está longe de cumprir qualquer utopia. Não se separa os “bons” dos “maus” como muitos gostariam (até porque somos ambos) e a “justiça” escolhe o lado que lhe convém e raramente é justa.
Na verdade, se avaliarmos a balança friamente, notaremos um desequilíbrio global gritante. Trata-se de um mundo em que o poder de consumo e o acesso à educação concentram-se nas mãos de poucos, submetendo, consequentemente, milhares às formas mais perversas de violência. A privação é, para mim, uma das maiores violências, pois ela gera outras e mantém suas vítimas sempre à margem, como massa de manobra, submetidas à violência física, à ignorância e sempre suscetíveis às manipulações e desmandos de alguns “eleitos”.

Apesar dos pesares, não sou adepto do pessimismo, e insisto em dizer que se o mundo não é ainda aquele que almejamos (e provavelmente nunca será), ele já é melhor do que o que tínhamos "ontem", e trabalhamos sempre no sentido de torná-lo mais "humano", menos individualista e com espaço para as diferenças. No fim das contas,  esperar uma realidade sem problemas é uma ideia totalmente irreal, mas não quer dizer que não tentaremos superá-los.

Voltando ao fim do mundo, que é o que interessa, sempre andamos no fio da navalha, e isso causa um fascínio mórbido.

Nos anos 80 vivíamos sob a ameaça de um holocausto nuclear, o que foi refletido em filmes como “O dia depois de amanhã” e serviu de plano de fundo para “Watchmen”, apontada como a obra máxima dos quadrinhos modernos. O primeiro tratava do medo concretizado, a guerra avassaladora entre as duas potências bélicas daquele momento: EUA e União Soviética. Já o segundo, explorava a paranoia, o medo vivido naqueles dias e até o cinismo inerente à humanidade diante do fim iminente. Hoje, não temos mais o risco do conflito atômico (pelo menos pensamos assim), mas persistem questões como a fome, a guerra, abuso de poder e ainda esperamos pelo dia seguinte.
Na expectativa do choque com algum meteoro, ou simplesmente por mais um dia em que novas profecias sobre o fim de tudo surgirão. Todos esperando o momento certo para nos tornarmos melhores, com nós mesmos e com os outros, quando o melhor seria compreendermos que este momento é agora.

domingo, 12 de agosto de 2012

O debate em torno da administração Lacerda



Bater na administração Lacerda (PSB) virou lugar comum, principalmente entre a classe artística de Belo Horizonte. O “Fora Lacerda” ganhou força através das redes sociais e ecoou, desfazendo a idéia tão divulgada de unanimidade em relação à aprovação da gestão do Prefeito, eleito através do que chamam de aliança “ornitorrinco”, dado o grau de estranheza: a impensável chapa PT e PSDB (!!!)

De fato o nível de aprovação de Lacerda entre a maior parte da população belohorizontina não é baixo, mas ao mesmo tempo me ocorre que a população brasileira como um todo desenvolveu um olhar preguiçoso sobre a política e nem temos uma base cultural fortalecida o suficiente, que possa favorecer qualquer análise mais criteriosa em relação aos nossos governantes. 
Conceitos como respeito à cidadania, liberdade de expressão, ainda soam vazios, alienígenas até, o que nos torna pouco exigentes. Basta um político não se envolver em escândalos de corrupção para que seja considerado “um bom político”. Talvez seja esse o caso do prefeito. Daí, não é de se estranhar que um político que fira qualquer um dos princípios citados não incomode uma boa parcela da população. O grau de alienação em relação a tais conceitos é tão grande que a “falta” deles não causa comoção, até porque falamos de um povo que nunca teve acesso real a tudo isso.

O caso da prefeitura é emblemático. Desde o início de sua gestão, Márcio Lacerda demonstrou pouca capacidade de diálogo, principalmente com o setor cultural (músicos, produtores, diretores de teatro, atores...), além de evidenciar um olhar equivocado de que a cidade poderia funcionar como uma empresa, onde é possível simplesmente demitir ou falar mais alto que os descontentes, como ficou evidente em uma reunião em que o prefeito se desentendeu com um dos recém empossados Conselheiros Municipais de  Cultura, e ordenou, sem cerimônia, que ele fosse retirado da sala. 

 Mais recentemente ele voltou a ser alvo de críticas com os seus “abrigos anti-mendigos”.  A imagem que se espalhou rapidamente pelas redes sociais (elas novamente) revelava que  pedras pontiagudas foram colocadas por debaixo de um determinado viaduto da cidade, com o objetivo de impedir que os "indigentes " se abrigassem no local. A prefeitura se manifestou dizendo que as pedras tinham o intuito de coibir a ocupação irregular, por se tratar de um lugar que oferece risco à vida, devido à possibilidade de alagamento.   Digamos que a preocupação seja realmente genuína. Ainda assim a forma é equivocada e não demonstra o menor indício de empatia ou vontade de levar "melhorias" a quem quer que seja. É, no mínimo, um "tiro no pé" em termos de marketing político.
Será que esse dinheiro não seria melhor aproveitado de outra maneira? Talvez numa tentativa realmente eficaz de devolver a dignidade ou amenizar o sofrimento dessas pessoas. 

De qualquer forma, a imagem em questão é estarrecedora. E mais assustador foi ver as manifestações on line que demonstravam um evidente repúdio aos moradores de rua. Há quem concorde e prefira a opção fácil de eliminar a “feiura” causada por quem vive tão à margem que sequer chega a ser uma preocupação quando medidas assim são tomadas. Uma máxima dos dias atuais é que “quem não consome não é gente”. Idem para quem não vota, ou para grupos cujo poder de decisão política se mostra inexpressivo.

Em uma matéria publicada pelo Jornal Hoje em Dia, Lacerda diz que pretende lidar com as manifestações de rua (protestos, passeatas e afins) disponibilizando 4 policiais para cada manifestante. Resquício da ditadura militar? Enfim, Belo Horizonte reflete um jeito brasileiro de se fazer política que se mostrava acanhado e perdeu a vergonha nos últimos anos: aquele em que vale a lei da mordaça e da restrição dos direitos individuais em favor da "ordem pública".

terça-feira, 17 de julho de 2012

"Jesuscidência"






No último domingo me senti mais uma vez enganado pela TV, por mais clichê que isso possa soar. Por alguma razão inexplicável (chame de boa fé ou ingenuidade mesmo), acreditei que a entrevista de Rosane Collor, ex-mulher do ex-presidente Fernando Collor de Mello, fosse trazer algum conteúdo relevante que valesse a pena a espera.

Para minha decepção, a matéria exibida, com destaque, pelo Fantástico pode ser resumida em banalidades como “revelações” sobre as práticas religiosas de Collor de Mello, sob um viés retrógado e conservado, vale ressaltar, reclamações da ex-primeira dama a respeito de sua pensão alimentícia e marketing descarado de um livro a ser lançado e que promete revelções bombásticas sobre o passado do ex-presidente.

O que mais me surpreendeu foi o fato de a Globo dar toda aquela atenção a uma matéria tão fútil, reforçando o vale tudo em sua procura por audiência , até dar voz, em horário nobre, a uma figura tão desprovida de conteúdo quanto Rosane Collor.

Na verdade a predileção por audiência acima de tudo não me surpreendeu, isso é parte do módus operandi da Vênus Platinada, desde a sua fundação nos anos 60. Mas o nível raramente chegou tão baixo. Rosane, por sua vez conseguiu a atenção que queria, e deve conseguir boas vendas de seu livro, tão logo ele saia, isso sem falar no fato de que a sua pensão deve sair dos míseros R$ 18.000,00 mensais para os tão almejados R$ 40.000,00.

De tudo o que foi dito a única coisa digna de nota, por falta de opção mesmo, foi o impagável “jesuscidência”, proferido por ela ao tentar explicar como a intervenção divina a livrou da má sorte provocada pelos atos religiosos nefastos do ex-marido.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Wagner Moura e o tributo



Há algum tempo estou acompanhando, assim, bem a distância, os comentários sobre um tributo ao Legião Urbana, com o ator Wagner Moura assumindo os vocais e a vez de front man de uma das principais bandas do pop rock dos anos 80. Responsabilidade gigantesca, principalmente tratando-se de um trabalho tão icônico, além do fato de a figura de Renato Russo ter sido tão marcante. Ele estava para o Legião Urbana como Fred Mercury estava para o Queen.  Enfim, missão ingrata. Mas acredito que a escolha de Wagner Moura se deu por conta da sua atuação no filme VIPS, no qual o seu personagem imita Renato Russo em uma festa,  e, é claro, por se tratar de um astro em ascensão que é declaradamente fã da banda brasiliense, o que torna idéia ainda mais interessante.

O tão propalado show aconteceu nesta terça, dia 29 de maio. Não pude assistir, mas os posts na internet classificavam a apresentação como “no mínimo” constrangedora. Até fiz um comentário na minha conta do facebook, muito baseado nos depoimentos nada elogiosos sobre a performance vocal do ator. Brinquei dizendo que nem o Capitão Nascimento, personagem que ele interpreta no blockbuster brazuca “Tropa de Elite” era tão corajoso. Um dia depois assisto a trechos do tal show no youtube para tirar minhas próprias conclusões.
Fato: Wagner Moura não é cantor, pelo menos não é um "profissional" da área, já que canta como passa-tempo em sua banda de rock. O peso maior de tudo está, principalmente, no fato de ele assumir a frente de um show tão importante, já que essa foi a última apresentação ao vivo da Legião Urbana e algumas músicas inclusive jamais foram executadas antes. Mas o show não deveria ser encarado dessa forma. A beleza da homenagem não está nos aspectos técnicos e, obviamente, não houve a intenção de equiparar quem quer que fosse ao excêntrico vocalista da banda.

Muitos dizem que ele deveria ter recusado o convite e evitado o “vexame” (foi mesmo?). Talvez. Prefiro a leitura de que ele representava ali milhões de fãs, gente que passou a adolescência cantando e recitando os versos, muitas vezes indecifráveis, de Renato Russo. E acho até que o fato de ele não ser um “cantor” como se espera, serviu para aproximar o público daquele momento que foi de total catarse. Afinal, quem, na casa dos 30, nunca cantou as músicas da banda (desafinado mesmo) e ensaiou, de forma desajeitada, as performances pra lá de estranhas do Renato Russo? Alguns viram uma celebridade que aproveitou a situação para se promover, o que é uma análise rasa que ignora o ótimo momento de sua carreira, já que Wagner é considerado um dos melhores atores brasileiros de sua geração, e isso não é pouca coisa.

 Eu vi um fã sincero que se divertia no palco, mesmo sem os atributos do seu ídolo, e, cá para nós: alguém esperava isso dele? O público cantou junto e foi difícil não me recordar dos meus já distantes dias de adolescente.
Nas palavras do Wagner Moura: “É Legião porraaaaa!!!”

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Efêmero...



O que é o efêmero?

O que chamamos de  fugaz, de momentâneo?

E o que é o eterno?
Talvez o que fique na memória...
Imagens gravadas na retina
Ideias e sensações que se fazem presentes pela simples menção...
Presentes!

No inexorável movimento do tempo tudo é fugaz...

A eternidade reside na lembrança... fluxo congelado na mente.

O que é o efêmero?
Talvez o momento que queremos eternizar.


terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Histórias cruzadas



The Help, filme americano que ganhou o título de “Historias Cruzadas” no Brasil, retrata a segregação racial nos Estados Unidos dos anos 60, trazendo a intolerância e o preconceito como motes principais mas apresentando o respeito e a amizade como contrapartida.  A história da jovem jornalista que retorna à sua cidade natal (Jackson) e resolve escrever um livro sobre a forma como as empregadas domésticas (todas negras) são tratadas naquela cidade é simplesmente tocante. Impossível não se indignar com o que a tela nos mostra, impossível também não se emocionar com as demonstrações de perseverança e superação das personagens. De um lado a garota branca do Mississipi que não se encaixa nos padrões conformistas e racistas de sua cidade e época, e,do outro lado, mulheres negras que têm que lidar com seus dramas pessoais e viver em uma sociedade tão abertamente segregada.

A idéia da dificuldade em transpor as barreiras sociais está presente o tempo inteiro, mas uma cena em particular me chamou a atenção: quando a personagem conta que é uma empregada doméstica, e que a sua mãe antes dela também o fora, assim como sua avó foi escrava. O relato demonstra a dificuldade em se romper o ciclo social e avançar. Ao ser perguntada sobre o que gostaria de ser, a personagem simplesmente não responde. Como se não tivesse sequer cogitado essa possibilidade, porque ela simplesmente não existia. Difícil segurar aquela lágrima que insistia em vir com as cenas mais tocantes.
A dificuldade existente em se caminhar apesar das condições ganha um retrato pragmático nessa cena, afinal a força de vontade é essencial, mas é necessário que ela venha em doses triplicadas para transpor barreiras tão difíceis. Esforço hercúleo empreendido tanto pela personagem em questão quanto pela jovem escritora, ambas tem que lidar com questões culturais muito arraigadas, ainda que de pontos de vista diferentes. Realizar mudanças é mais perigoso e difícil do que realmente parece e o filme traz isso para a tela, pessoas que se recusam a aceitar realidades tão desiguais e do outro lado sempre há quem deseje manter a todo custo o status quo. Impressionante como o diretor consegue tratar o tema com  leveza, inserindo boas pitadas de bom humor às situações, dosando muito bem elementos dramáticos com os momentos de alívios cômicos.  Trata-se de um filme para ser visto e revisto. Boas atuações, direção e uma boa história, mesmo que triste.
Ao final da sessão as lágrimas não tinham chegado, muito mais por uma inexplicável restrição em demonstrar emoções em público do que pela falta de empatia com a história, com a qual me identifiquei em um nível muito pessoal.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Conceição



Com esse título, é inevitável lembrar da música do Caubi Peixoto. Mas não é este o ponto.
É engraçado como crescemos e passamos uma boa parte de nossas vidas sem nos dar conta de quem realmente são nossos pais, ou melhor sem compreendê-los enquanto as pessoas que eles são. Sem querer me arriscar com minha psicologia barata, mas acredito que isso se deve ao fato de passarmos muito tempo com uma ideia preconcebida de quem eles são. Enfim, são figuras que se encontram completas em nossas mentes, e durante um período considerável os enxergamos como indivíduos sem falhas, verdadeiros arquétipos. Depois os consideramos obsoletos, porque o comportamento “descolado” dos colegas de adolescência se revela muito mais interessante.
Passada essa fase turbulenta de hormônios em agitação e compreensão do mundo (essa última não cessa nunca) passamos a vê-los como são, como pessoas. No entanto, a idéia maternal/ paternal mantém uma barreira que nos impede de ver a totalidade da pessoa por trás daquela figura a quem aprendemos a respeitar. Minha mãe, Conceição Francisca Dias, se encaixa na descrição. Exemplo de luta, ela veio cedo para Belo Horizonte, trabalhou como diarista para garantir o sustento e foi com esse suor que ela conseguiu criar os três filhos. Digna de admiração, com certeza. Eu sempre soube disso, mas ela ainda me surpreende.
Ela, assim como milhares de brasileiros vindos da zona rural, não teve a oportunidade de estudar, as circunstâncias da vida não lhe deixaram escolhas. Entre os três filhos sou o único que ingressou em uma faculdade. São outros tempos, época em que os estudos se tornaram mais acessíveis, mesmo assim sei que pertenço a uma estatística pequena de negros que conseguem alcançar a formação superior, ainda que com uma base escolar deficitária e numa universidade particular (paradoxos dos nossos tempos). 

Certa vez minha mãe, dona de uma sabedoria empírica e um olhar muito mais atento à realidade que muita gente “instruída”, comentou o quanto se realizava através dos meus estudos. E ela não referia-se ao dinheiro que eu poderia vir a ganhar, mas à possibilidade de expressão que ela nunca tivera e eu poderia ter. Ela compreendia muito bem o valor simbólico vindo do conhecimento e me disse o quanto era ruim não poder “dizer” as coisas e participar de determinadas discussões, simplesmente por não saber o que e como dizer. Encerrou a fala enfatizando que estava feliz por eu ter a oportunidade que ela não teve, de intervir, participar...
A cada nova conversa eu aprendia um pouco mais sobre aquela pessoa, de quem eu julgava erroneamente saber tudo, e aprendia mais sobre mim também. Mas de tudo, o mais importante é que, apesar das privações, minha mãe desenvolveu uma visão de mundo humanista, com valores que muita gente só cultiva superficialmente, talvez até para atender a uma exigência social. Ela se ressentia por não ter nos dado mais, e eu a corrijo sempre, porque ela nos deu muito. Teto, educação e as condições para que eu pudesse escolher o caminho que escolhi, além do exemplo e a inspiração para que não desistíssemos diante de qualquer dificuldade, tanto ela quanto minha tia Luzia, minha segunda mãe. Eu não poderia ter sido criado por pessoas melhores.
Mãe sempre tem razão, mas devo discordar, de novo, quando ela diz que não sabia o que e como dizer. Ela e minha tia estão entre as pessoas mais sábias que conheci ao longo da vida. E o valor não está em "como", mas no conteúdo do que é dito. 

domingo, 29 de janeiro de 2012

Um câncer chamado especulação imobiliária (vide Cracolândia e Pinheirinho)



O governo de São Paulo tem feito por merecer as alcunhas que recebeu nos blogs e redes sociais. A gestão de Geraldo Alckmin se mostra cada dia mais fascista e retrograda. Absurdo o tratamento dado aos viciados da cracolândia paulistana, relatos de violência desnecessária utilizada pelos policiais pipocam nas redes. O que é, nitidamente, um problema de saúde pública foi transformado em um caso de enfrentamento policial, infringindo mais sofrimento àquelas pessoas. O plano mirabolante consistia em privar os viciados da droga e do lugar onde a utilizavam forçando-os a procurar ajuda, o que consequentemente reduziria o consumo.

Inflamando ainda mais a situação, a operação se mostrou atabalhoada quando vários viciados não conseguiram se internar ao procurarem a tal ajuda anunciada. A cidade não contava com a infraestrutura necessária para receber os usuários, o que só me leva a concluir que não houve de fato preocupação em preparar clínicas de tratamento em quantidade o suficiente para a demanda. Ao que tudo indica, a medida tem cunho meramente higienista, ou seja, a intenção é “limpar” aquela região da cidade para valorizar os imóveis. Tudo em nome de um câncer chamado especulação imobiliária.

O massacre de Pinheirinho, comunidade onde moravam mais de seis mil pessoas, em São José dos Campos, foi outra ação equivocada de Alckmin e Cia. A tropa de choque foi enviada para restituir a propriedade a Naji Nahas, empresário que, segundo informações, deve milhões à prefeitura de São Paulo. Tanto Geraldo Alckmin quanto Eduardo Cury, respectivamente, governador de São Paulo e prefeito de São José dos Campos, são agora responsáveis por um dos episódios mais emblemáticos no que diz respeito à violação de direitos humanos em nossa história recente. Os relatos são assustadores e vão de espancamentos a óbitos, incluindo uma criança de 4 anos que teria falecido após ser atingida por uma bala de borracha no pescoço.

O episódio indescritível e inominável para mim, custou caro para a imagem política do governador e do prefeito, é o tipo de mancha difícil de esconder. Agora que o estrago foi feito, ambos anunciam a construção de casas populares para abrigar pessoas pobres da cidade, o que poderia ter sido feito antes e sem nenhuma intervenção militar.

Choca? Sim e muito, mas tão surpreendente quanto isso é notar que uma boa parcela da população apóia o que aconteceu lá. Não foram poucos os comentários que li na internet em que as pessoas diziam concordar com o que foi feito, tudo baseado na defesa da “propriedade privada”, com argumentos do tipo: “imagine se invadem a sua casa, você concordaria?”

O grau de individualismo e ignorância chega a ser tão extremo que o sujeito não consegue diferenciar um latifúndio que foi utilizado para uma função social, não entro aqui em discussões legais, de uma propriedade que de fato é a moradia de alguém. Muito menos se dá conta de que cerca de seis mil pessoas estão agora desabrigadas e com marcas profundas em seus históricos pessoais. Como se não bastasse a pobreza, esses cidadãos foram tratados como criminosos e, por mais que a reintegração de posse estivesse dentro da Lei, a ação truculenta e irresponsável não se justifica. Era uma obrigação do Estado estabelecer um canal de diálogo e encontrar uma solução pacífica. O Brasil reforçou aqui sua conhecida tradição de ojeriza aos movimentos sociais e tratamento violento para as camadas mais pobres. Repressão, porrada e cadeia para quem não se enquadra ou abaixa a cabeça. Histórias como a de Canudos, registrada no romance de Euclides da Cunha, parecem se repetir e é incrível o quanto a situação se mantém praticamente inalterada, não importa o quanto avancemos em outros aspectos.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Inadequado



O recente caso do suposto estupro no BBB, envolvendo os participantes Daniel (31) e Monique (23) trouxe à tona, de maneira ainda mais evidente, algumas facetas nada dignas de orgulho do nosso comportamento. Há quem diga que Monique é culpada pelo que aconteceu, como se tivesse dado permissão para o abuso sexual, opinião que revela um dos lados mais repulsivos do machismo tão vigente no país. Do outro lado, há quem associe a conduta, sem dúvida condenável, de Daniel à sua condição de negro, o que evidencia outro preconceito profundamente arraigado em nossa cultura e que se mantém velado na maior parte do tempo, mas se mostra de maneira desavergonhada em momentos assim.

Tão ruim quanto tudo o que foi citado até aqui é o comportamento da mega corporação televisiva que transmite o reality show no Brasil. A Rede Globo tentou até o último momento ignorar o que aconteceu e só tomou uma posição quando viu que não tinha como ignorar a opinião pública, vide o caso da marcha pelas Diretas Já em 1984, quando a emissora disse de maneira clara que era tudo parte das comemorações do aniversário de São Paulo.

Daniel está fora da casa e já responde moralmente por seu erro, aguardando agora as devidas sansões legais. A nota da Rede Globo classifica o comportamento de Daniel como “inadequado”. Correto. Mas não deixa de ser irônico, principalmente vindo do canal de TV que promove e veicula um reallity show que propicia o que há de mais degradante no comportamento humano, e vende isso como uma espécie de padrão a ser seguido, uma vez que transforma desconhecidos em celebridades, premiando a super-exposição midiática, super-valorizando atributos físicos em detrimento de aspectos comportamentais e tornando tudo isso parte do kit de objetos de desejo do cidadão comum. O que é mesmo “inadequado”?

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Osama salvaria Obama?



Tão perto das eleições presidenciais norte-americanas (novembro de 2012) e aquele otimismo que contagiou a todos na ocasião em que Obama foi eleito parece simplesmente ter desaparecido. Vamos aos fatos: há poucas razões para qualquer otimismo em relação ao futuro político dos Estados Unidos. O país não tem apresentado indícios de crescimento e sua máquina de guerra começa a lhe custar caro, atingindo uma região sensível do Tio Sam, o bolso.
Redundante dizer, mas vale lembrar assim mesmo, que W Bush, o antecessor de Obama, havia realizado uma campanha tão ruim que até o estadunidense mais conservador estava ansioso para se livrar dele, logo o mundo respirava aliviado pelo fato de George se despedir da Casa Branca. Isso foi amplificado um milhão de vezes com a possibilidade de o novo ocupante da cadeira presidencial ser um negro- o que era, e é, uma quebra de paradigmas digna de nota - além de ser do partido republicano, "O" contra-ponto ao que Bush representava políticamente.
No entanto, a América continuaria a mesma. Não me lembro de quem foi essa frase mas ela se encaixa perfeitamente no contexto “somos um país muito conservador e não mudaremos tão facilmente”, Fato! Logo é ilusão imaginar que alguém poderia se sobrepor a toda a história política dos Estados Unidos da América e mudar drasticamente sua relação com o restante do mundo.
Mas o maior desafio do então novo presidente não se encontrava nos embates bélicos do oriente médio e sim em casa. A economia precisava crescer, era necessário que mais empregos fossem gerados, o que não aconteceu de forma expressiva.
Hoje a realidade econômica dos norte-americanos é ainda mais grave e isso se reflete em movimentos como o Ocuppy Wall Street e o Tea Party. Embora partam de pontos de vista antagônicos (o primeiro situado mais à esquerda e o segundo proveniente de uma linha conservadora de direita) os dois movimentos demonstram a insatisfação dos americanos com a stual situação e demonstra a fragilidade financeira do país. Segundo especialistas, a desigualdade social americana é comparável a países da América do Sul e da África.
Como resultado, o eleitorado que deu a vitória a Obama se sente enganado porque o Presidente não pôde reduzir as disparidades sociais, e os mais tradicionalistas, normalmente ligados às elites econômicas norte americanas, anseiam por um sucessor que seja capaz de preservar o status quo e os privilégios de alguns grupos.
Escrevi há algum tempo que a morte de Osama Bin Laden, ícone máximo do terrorismo após o 11 de setembro, poderia dar vantagens a Obama nas reeleições, mas ao que parece isso não irá comover o povo americano se seus bolsos continuarem vazios. Trocadilho infame, mas pertinente: nem Osama salva Obama. Piadas a parte, o que assusta é que, no lugar de Obama, a Casa Branca pode receber um republicano ainda mais retrógrado do que George Bush foi, e então teríamos um Estado Americano muito menos disposto ao diálogo do que o que temos hoje. Nada é tão ruim que não possa ser piorado.